• 19 fevereiro, 2018

Mindfulness e Felicidade

Atenção: note o mundo ao redor

Já teve a sensação de que deve haver algo mais na vida? Boa notícia: sim, há! E está bem aqui na nossa frente. Apenas precisamos parar e notar. Aprender a estar mais consciente e atento pode realizar maravilhas para nosso bem-estar em todas as áreas da vida — como em nossa caminhada para o trabalho, o modo como comemos ou em nossas relações. Fazer isso ajuda a nos afinarmos com nossos sentimentos e evita que fiquemos habitando o passado ou se preocupando com o futuro — então nos beneficiamos mais do dia-a-dia.

A chave para notar e perceber é a “atenção plena” (“mindfulness”, em inglês). Esse termo é geralmente definido como “o estado de estar atento e consciente em relação ao que está acontecendo no presente”. Dois elementos fundamentais da atenção plena são:

  • Ela é intencional, ou seja, estamos conscientemente praticando-a
  • Estamos aceitando, em vez de julgando o que percebemos e notamos

Em outras palavras, atenção plena é “vivenciar abertamenta o que está presente”. É sobre ter tanta consciência quanto possível em relação ao que nos cerca — podemos ver, ouvir, tocar e saborear — e ao que está acontecendo internamente — nossos pensamentos e sentimentos. Fundamentalmente, se refere a observar tudo isso mas não ser capturado pelo hábito de ficar pensando e se preocupando sobre o que estamos observando. Portanto, essa capacidade nos dá mais controle sobre onde decidimos colocar nossa atenção.

Um número crescente de estudos científicos estão demonstrando os benefícios da atenção plena para muitos aspectos de nossas vidas, incluindo nosso bem-estar físico, relações pessoais e bom desempenho nos estudos e trabalho. Aparentemente, os benefícios são para todos, de crianças a idosos. Um pesquisador até sugere que uma vez aprendida, a atenção plena tem uma qualidade “transmissora”. Seus benefícios aumentam com o tempo e, com a prática, podem se difundir para muitas áreas de nosso cotidiano.

No entanto, atenção plena é algo que — no presente mundo sempre ocupado e multi-tarefa — poucos de nós cultiva naturalmente. Mas isso é algo que todos podem aprender e se beneficiar. É simples, mas pode parecer difícil até que você aprenda. É por isso que envolve prática.

O custo da ausência de atenção plena
Imagine: já aconteceu de ir pegar algo em outro lugar e esquecer o que era? Ou estar conversando com alguém e se dar conta de praticamente não escutou o que a outra pessoa disse? Ou comer uma refeição sem realmente sentir o gosto (por exemplo, ao ver TV ou ler)? Ou entrar em piloto automático em uma rota familitar — como o caminho do trabalho ou colégio — e, ao chegar, não ser capaz de lembrar nada sobre o trajeto naquele dia? Esses são todos exemplos da ausência de atenção plena. E é algo muito, muito comum.

Normalmente estamos tão absortos em nossos pensamentos sobre o que aconteceu ou está para acontecer — ou seja, passado e futuro — que percebemos bem menos o presente. E, ainda assim, o surpreendente é que a única coisa que podemos ter certeza de que está acontecendo é o aqui e agora.

A psicóloga de Harvard, Ellen Langer, adverte que a ausência de atenção plena pode ser bastante custosa para nós em termos de saúde e felicidade. O pior é que, diz ela, quando não temos atenção plena, obviamente não temos consciência disso! Mas a boa notícia é que, embora a ausência de atenção plena seja um hábito, isso é algo que podemos aprender a substituir.

Atenção plena se parece com o que?
É uma habilidade geralmente associada com a meditação, mas não é praticada apenas quando sentamos quietamente. APRENDER A MEDITAR é apenas uma das maneiras (embora uma muito boa) de aprender e praticar atenção plena.

Estar mais engajado no momento presente pode levar a uma experiência mais rica das coisas que, de outro modo, poderiam passar direto por nós enquanto estamos presos em pensamentos sobre o passado ou incansavelmente pensando sobre o que fazer depois. Por exemplo, notar as folhas dançando em uma árvore, um pássaro planando no vento, o cheiro de uma nova flor, a cor do céu ou o sorriso na face de alguém que passa.

Claro que precisamos planejar, relembrar e processar experiências, mas se começarmos a ter mais atenção plena provavelmente nos surpreenderemos com a grande quantidade de tempo que geralmente gastamos fora do momento presente, e quão prazeiroso e relaxante estar nele pode ser.

Ter atenção plena não é algo místico — isso tem sido praticado em diferentes culturas por milênios, e variações podem ser encontradas em todas as grandes fés, incluindo cristianismo, judaísmo, islamismo e budismo. Mas a atenção plena não requer nenhuma forma de fé religiosa ou crença — está disponível para todos. Talvez uma forma melhor de considerá-la é como algo que foi perdido nas gerações recentes ao mesmo tempo em que o velocidade da vida e a quantidade de informação a processar aumentou.

Pesquisa sobre os benefícios
Ter mais atenção plena é algo que, de modo amplamente demonstrado, pode beneficiar nossa saúde física e felicidade. Muitos estudos foram conduzidos especificamente em pessoas que aprenderam alguma forma de meditação ou completaram o programa chamado “redução de estresse baseado em atenção plena” (MBSR, na sigla em inglês).

Alguns estudos sobre ela tiveram amostragens pequenas e um número limitado teve controles randômicos (o que em termos científicos significa que não devemos confiar demais neles). E algumas áreas de interesse, como atenção plena para crianças, ainda estão nos estágios iniciais. Contudo, essa está se tornando uma área ativa de pesquisa científica e há um número crescente de estudos demonstrando benefícios em diversos aspectos de nossas vidas. Veja abaixo.

Benefícios físicos
Foi demonstrado que a atenção plena ajuda a lidar com a dor, ansiedade e reduz a pressão sanguínea. Em algumas situações, beneficia o sistema imunológico e melhora certas condições de pele. Foi até demonstrada uma ligação com pessoas idosas vivendo mais. De fato, a técnica já está, de modo crescente, sendo usada em diversos ambientes médicos.

Estudos recentes sugerem que meditar em atenção plena altera fisicamente nossos cérebros, para melhor. Pessoas que praticam regularmente mostram:

Atenção plena ajuda a lidar com estresse
Há indicações de que a atenção plena é um modo efetivo de lidar com estresse. Diversos estudos demonstraram que variadas formas de atenção plena têm relação com níveis reduzidos de cortisol, o  hormônio do estresse. Alguns pesquisadores até argumentam que a prática reverte os efeitos do estresse crônico.

Outro estudo descobriu que meditadores experientes têm uma reação inicial elevada a estímulos estressantes, mas se recuperam mais rapidamente. Outros pesquisadores demonstraram que indivíduos com índices elevados de atenção plena viam situações difíceis como sendo menos estressantes e tinham menor probabilidade de evitar encará-las.

A atenção plena também está associada com os benefícios de mais relaxamento e descanso. Mas não é a mesma coisa que isso. Durante a prática da atenção plena, a atenção está ativa — a ciência demonstrou que há diferenças psicológicas em comparação com períodos de relaxamento ou descanso. De modo interessante, a técnica parece nos ajudar a estar mais relaxados, porém mais alertas. Níveis elevados de atenção plena também foram recentemente associados com melhor qualidade de sono.

Bom desempenho
Pesquisas mostram alguns benefícios que a atenção plena pode ter em nosso bom desempenho, além de nos capacitar para lidar melhor com o estresse. Por exemplo, diversos estudos já demonstraram que ela pode melhorar a:

  • memória e flexibilidade mental;
  • atenção e habilidade de concentração;
  • habilidade de aprender e desempenho escolar;
  • diversos aspectos ligados ao raciocínio criativo e criatividade.

Outras análises sugerem inclusive que a atenção plena pode ter benefícios para um bom desempenho no ambiente de trabalho, incluindo habilidade para tomar decisões, saúde & segurança, e resolução de conflitos.

Bom funcionamento mental
Alguns psicólogos propõe que a atenção plena leva ao bem-estar e a um florescimento porque promove uma melhor regulação do comportamento. Ela faz isso ao nos dar uma consciência mais completa sobre condições internas e externas, permitindo uma avaliação mais exata, escolhas mais conscientes (portanto, mais flexíveis) e reações menos automáticas e impulsivas.

Estar mais consciente de nossos pensamentos e sentimentos relacionados também está associado com a redução da ruminação, ansiedade e depressão, que leva a um aumento de resiliência e bem-estar psicológico.

Emoções positivas e felicidade
Além dos benefícios para nossa saúde e funcionamento psicológico, a atenção plena demonstradamente aumentou diretamente a quantidade de emoções positivas em diversos estudos científicos. Por exemplo, os cérebros de praticantes regulares mostram padrões de ativação das áreas de nosso cérebro associadas com sentir-se bem (e ativação reduzida das áreas ligadas a preocupação e estresse).

Um estudo mostrou que um grupo que passou por um programa de melhora na felicidade junto com instruções de meditação apresentou um índice de satisfação maior do que aqueles que passaram só pelo programa de felicidade. Outros estudos demonstraram que níveis individuais de atenção plena estão associados com aumento do bem-estar emocional, psicológico e social e com índices mais elevados de satisfação na vida, emoções positivas e menos emoções negativas.

Recentemente, a psicóloga Barbara Fredrickson mostrou que praticar meditação de gentileza amorosa aumenta a experiência de EMOÇÕES POSITIVAS com o tempo, levando a um aumento em diversos recursos internos que, por sua vez, foram determinantes para mais satisfação na vida e redução nos sintomas de depressão.

Outros psicólogos mostraram que nossa habilidade de desfrutar de experiências positivas em nossa vida é um fator importante para a felicidade. Enquanto podemos rememorar com prazer experiências passadas ou antecipar as futuras, saborear o presente é o importante. Ao termos mais atenção plena no dia-a-dia, podemos aproveitar o cotidiano ao máximo. Por exemplo, comer uma refeição predileta, caminhar até a escola ou trabalho, sentar em um jardim ou parque e relaxar em um banho quente.

Um fator que é tóxico para nossos níveis de felicidade é a comparação social e desejar o que não temos — por exemplo, um celular melhor ou um carro ou casa maiores. Um estudo recente sobre desejos materiais de estudantes universitários na Inglaterra e trabalhadores adultos nos EUA indicou que mais atenção plena está ligada a uma redução na diferença entre o que as pessoas têm e o que desejam, e isso foi relacionado com maior bem-estar subjetivo (uma medida de quão feliz a pessoa é). De modo importante, o resultado não tinha ligação com o nível de renda pessoal (o grupo estudado era de classe média). Mais ainda, quando um grupo aprendia atenção plena, a diferença entre ter e querer diminuía, e o bem-estar subjetivo aumentava.

Relacionamentos e nossas comunidades
Estudos mostram que a atenção plena pode beneficiar nossos relacionamentos e, assim, talvez nossas comunidades locais também. Por exemplo, o treino aumenta a empatia e os níveis de compaixão em relação às outras pessoas. Muitos tipos de meditação ou práticas de atenção plena incluem focar em nossas ligações com os outros, e algumas foram desenvolvidas especificamente para isso. Ambas podem afetar positivamente nossas relações.

Por exemplo, um estudo com casais que passaram por um programa de atenção plena que envolvia meditação de gentileza amorosa e atenção plena focada em questões de relacionamentos, demonstrou significativa melhora na satisfação com o relacionamento, assim como aumento de otimismo, participação, espiritualidade e relaxamento. Outro estudo com praticantes mostrou que uma outra técnica de meditação teve impacto positivo em seus relacionamentos pessoais.

Também se sugere que a meditação em atenção plena pode ter benefícios para nosso comportamento ético e moral e, assim, beneficiaria nossa comunidade e sociedade. Por exemplo, pode aumentar nossa sensibilidade aos pensamentos e sentimentos dos outros, e nossos níveis de empatia e compaixão que, por sua vez, aumentam nossa sensibilidade ao impacto de atos anti-éticos e nos direciona a ajudar os outros. De fato, um estudo inicial indicou que a meditação pode sim ter esses benefícios em potencial.

Atenção plena com o meio ambiente
Já que a atenção plena nos permite abrir-se mais ao presente e nos torna mais conscientes das coisas ao redor, poderia ela nos ajudar a cuidar do ambiente natural, com um impacto de fato sobre nossa felicidade e a dos outros?

Como a evidência crescente dos benefícios da atenção plena para nossa saúde e felicidade, há também evidências cada vez maiores do papel que o meio-ambiente tem sobre nosso bem-estar. Então, é provável que os dois estejam relacionados. De fato, alguns modelos “ecológicos” de bem-estar propõe uma relação entre mente, corpo, bem-estar espiritual e o mundo natural.

Até agora, contudo, parece haver poucos estudos ligando os dois. Mas suspeitamos que há uma forte conexão entre estar mais consciente do meio-ambiente, cuidar dele, bem-estar e felicidade. [nota do tradutor: dois estudos posteriores, de forma inicial, já demonstraram a relação entre proximidade com a natureza e bem-estar]

Ressalvas e críticas à atenção plena
No exterior, a atenção plena é a forma mais popular de meditação secular, ou seja, totalmente independente de uma tradição espiritual. O “pai” dessa abordagem é o médico Jon Kabat-Zinn, que baseando-se na meditação budista começou a difundir a técnica de “redução de estresse baseado em atenção plena” (MBSR, na sigla em inglês) já em 1979. Devido à ampla difusão dessa técnica (e similares) no exterior, inevitavelmente, controvérsias surgiram a continuam aparecendo.

A principal crítica se refere ao aspecto comercial e materialista do modo como a atenção plena vem sendo difundida em certos meios. Detratores até se referem pejorativamente a isso como “McMindfulness”, já que esse tipo de meditação está maciçamente disponível hoje nos países desenvolvidos do mesmo modo como, por exemplo, a hatha yoga é oferecida em muitas academias: apenas como um tipo de ginástica (para o cérebro/mente, no caso da meditação).

No entanto, como se trata de uma técnica puramente secular, intimamente ligada a estudos empíricos, cujo treinamento era feito inicialmente em faculdades, passando depois para cursos e workshops de certificação profissional, sua exploração comercial é inevitável. A técnica, desde o início, já estava planejada dentro de um tipo de especialização profissional, no início ligada à medicina. Mesmo assim, a iniciativa não deixa de ser bastante elogiada, por poder beneficiar um público imensamente maior, através de uma técnica baseada em uma sabedoria ancestral, aliada a estudos científicos.

Um alvo preferido das críticas é que a atenção plena está sendo amplamente usada em grandes corporações como uma forma de tornar seus funcionários mais eficazes. Como a técnica deriva da meditação budista, que tem como objetivo reduzir o sofrimento, teria ocorrido uma perversão de valores, já que esses conglomerados de empresas muitas vezes ativamente contribuem para o sofrimento no mundo.

Outra crítica foca o dano que instrutores desqualificados podem cometer ao ensinarem a técnica. Por ser algo que lida intimamente com a mente, distúrbios podem surgir ao se iniciar a prática e instrutores despreparados podem, ou não saber como lidar com a situação, ou simplesmente não prover acompanhamento nenhum aos praticantes.

É possível ensinar a técnica apenas como uma habilidade de focar e concentrar a mente, sem relação com valores humanos. Por ser uma crítica amplamente difundida, esse é um problema que já está sendo resolvido simplesmente acrescentando-se valores humanos, ou criando-se abordagens similares, que enfatizam em igual medida a dimensão ética da prática.

Defensores do movimento respondem que abusos e contextos distorcidos inevitavelmente ocorrem, do mesmo modo como acontece com a ciência, ou com a chegada de uma nova tecnologia. No entanto, dizem, os benefícios potenciais são muito maiores do que esses possíveis danos.

Sobre a ausência de contexto ético no ensino da atenção plena, alguns instrutores respondem que, quando praticada da maneira correta, valores humanos como altruísmo e respeito surgem inevitável e espontaneamente (isso já foi demonstrado em pesquisas). No entanto, parece uma opção mais segura assegurar-se de que valores humanos altruístas estejam presentes desde o início, em vez de assumir que a técnica será praticada de modo correto.

Atenção plena no Brasil
No Brasil, a técnica ainda está nos estágios iniciais de difusão — tanto que muitos, curiosamente, ainda preferem usar a palavra em inglês “mindfulness”, o que não ajuda muito na popularização. Outro ponto que chama a atenção é que quase não há opções para se aprender pessoalmente esse tipo de meditação de modo gratuito ou com custo popularmente acessível.

No entanto, nesse ponto as críticas não necessariamente se justificam, pois como já mencionado, o aspecto de “especialização profissional” (e, consequentemente, comercialização) da técnica está em sua origem e natureza.

Um outro modo de colocar a questão é que, em países menos desenvolvidos como o Brasil, novamente a maioria da população pode não ter acesso a algo imensamente benéfico e, da mesma maneira como ocorre com outros tipos de meditação, isso continuará sendo algo exclusivo para a elite.

Há também um curso online baseado em Portugal, que pede para que seja feita uma doação para qualquer instituição de caridade como requisito para a participação: o ZBHD.

Atenção plena no movimento Ação para Felicidade
No movimento Ação para Felicidade, a meditação em atenção plena é apenas uma das ações que promovemos. E isso é colocado dentro do contexto altruísta de nossa missão: criar mais felicidade e menos infelicidade na sociedade.

Sobre a competência necessária para se ensinar a técnica, nossa recomendação é que apenas instrutores certificados ou meditadores com ampla experiência ensinem meditação de atenção plena. Quando isso não for possível, nos encontros são utilizados vídeos gravados por instrutores qualificados.

FONTE: Ação para felicidade

Fonte: Flowing