• 14 abril, 2019

Mestre em meditação escreve sobre a importância da atenção à respiração

“Observar abre as portas para controlar o ar, a mente e a si mesmo”, diz Satyanatha

O sol já tinha se posto, e a luz do luar tocava, tênue, as infinitas folhas e plantas ao meu redor. O ar intenso, puro, brincava na brisa e fazia com que minhas simples vestes de monge balançassem. As folhas sussurravam suaves. O vento flutuava, voava, passando por mim. Preenchia as minhas narinas e me tornava parte daquela vida, de tudo, do todo. Vinha das árvores sem conta que ficaram o dia fazendo a fotossíntese e agora descansavam enquanto eu recebia o inestimável presente que elas me davam: ar cheio de energia e oxigênio. No escuro da noite, eu aprendia a respirar caminhando atento pelo sagrado monastério.

A arte da respiração é a mais poderosa de todas no início da meditação. Assim como as energias sutis que queremos um dia claramente sentir, o ar é invisível — mas tangível, material, uma ponte entre o mundo sutil e o concreto. Os antigos mestres do Himalaia descobriram uma belíssima técnica, que é verdadeira até hoje: a velocidade da sua respiração determina a velocidade de seus pensamentos. Lembra? Você já sabia disso. Se alguém chega respirando rápido sem ter corrido, com frases curtas e encadeadas, aspirando com pressa, sem dar tempo para que os pulmões se encham — você já sabe que essa pessoa está ansiosa, assustada, excitada. Essa maneira de respirar indica exatamente a maneira dela de pensar naquele momento: muitas ideias pulando na mente.

Quando a ansiedade é crônica, a pessoa passa muitas horas assim. É um círculo vicioso: a respiração rasa, que se dá principalmente no topo do peito, sem puxar o ar para baixo, no tórax, aumenta a ansiedade, que era sua causa inicial, e assim até a agrava.

Sabe o suspiro, aquela gostosa reação involuntária em que deixamos entrar todo o ar que conseguimos, e com uma exclamação de alívio — aaaaah! — expiramos bem rápido? Ele serve para romper um padrão; quebra o que havia na mente e na nossa relação com o ar, e assim nos dá uma nova chance. Mas, se não soubermos da arte da respiração, voltaremos para o comum, um reflexo da emoção que estivermos sentindo. Seu estado mental determina a respiração se você não a observa. Mas sua respiração consciente pode mudar o estado mental e virar o jogo.

O mais importante é perceber como você respira, não só na meditação, mas o dia todo — e principalmente quando alguma emoção forte vem. Coloque a mão sobre o peito com carinho. Inspire pelo nariz, sentindo o ar desde lá embaixo no corpo, na barriga, com o músculo do diafragma. Ele preenche seu tórax por completo, as costelas parecem se abrir; e só por último o peito sobe, não antes. Respire assim algumas vezes, por um minuto, se puder. Então controle o fluxo: o ar deve sair mais devagar do que entrou, cerca de um terço mais lentamente. Sem forçar, use os pulmões na sua plenitude. Isso avisa ao sistema nervoso parassimpático que ele pode relaxar. A corrente sanguínea muda sutilmente sua composição de hormônios, a mente fica mais equilibrada e é mais fácil pensar.

Centenas de técnicas de respiração formam a base da meditação. Todas aceitam este fato: você respira como pensa, e vice-versa.

Observar abre as portas para controlar o ar, a mente e a si mesmo. O oxigênio vem das plantas e do mar, tocados pelo sol. Somos parte da vida deste planeta. Depois de respirar com atenção e delicadeza, é mais fácil perceber isso; para então encher-se de gratidão, amar a vida e a natureza, controlar a mente — e ser feliz.

FONTE: Veja SP – a Tal Felicidade, por Satyanatha

Fonte: Flowing